Os amanhãs que não cantarão...
... “And I see through the windows like I see through the lies
Like I see through every useless disguise
That everyone wears but everyone swears that they don't
Oh and don't mind me baby, I'm only dying slow…
A ambição descomedida de um político que conseguiu perder uma eleição que estava ganha há anos; a deriva pouco inocente de um percurso que nunca fora o da esquerda socialista; a capacidade (manhosa) de transformar críticas anteriores aos seus predecessores (as vitórias que sabiam a “poucochinho”) em derrotas que sabem a muitíssimo são, a partir de agora, virtudes políticas.
Costa, perdida a eleição poderia pelo menos ter salvo a honra. Mesmo que eu não aprecie por aí além o discurso de corda ao pescoço com que os políticos em desgraça se dirigem aos seus eleitores, tão pouco aceito as fugas para a frente que esta pseudo “frente popular” que se anuncia.
Costa defenestrou Seguro mesmo depois deste ter ganho umas eleições autárquicas e outras europeias.
Seguro não era grande espingarda mas, pelo menos, durante o consulado de Sócrates, nunca se comprometeu com a política suicidária dos dois governos PS, mormente o último onde o escândalo só foi ultrapassado pelo desastre económico e financeiro. É verdade que Seguro, estava refugiado na última fila do hemiciclo, calado que nem uma lapa neurasténica. É verdade que o silêncio (que dizem tolamente ser de oiro) é apenas silêncio. Mas no meio do vozear informe dos seguidores de Sócrates esse silêncio era pelo menos grave e apelava sem sucesso a uns segundos de serenidade.
Sócrates caiu pela acção conjunta da Direita (que apesar de tudo lhe permitira governar – como antes fizera em relação a Guterres seguindo o entendimento que tal tarefa compete ao partido mais votado)e da Esquerda entusiástica do PC e do BE.
Parece que, na altura, nenhum dos ultrademocráticos dirigentes destas duas formações se lembrou de estar a ajudar (e de que maneira) a temível Direita “ultraliberal”. Parece, igualmente, que nenhuma destas luminárias tinha noção dos programas da Direita a quem tão generosamente abriam escancaradamente as portas da governação.
Diga-se, em boa verdade, que no mesmo erro não caíram a dr.ª Ferreira Leite e o dr. Pacheco Pereira. Estes, movidos pela amargura de uma retumbante derrota interna, pela pesporrência e pela alta ideia que têm de si mesmos começaram logo a questionar Coelho. Esta gente além do ego monstruosamente inflacionado tem a memória longa e a dor de corno perpétua. Como aliás se vai vendo e (quando há pachorra) lendo.
Durante a campanha eleitoral, PC e BE brindaram Costa e o PS com uma espantosa girândola de epítetos desqualificantes. A la rigueur só não lhe chamaram “fascista” porque a palavra, de tão usada, perdeu qualquer efeito revulsivo.
Costa, no dizer estalinistoide de Jerónimo, era “farinha do mesmo saco” de Coelho. A expressão é pejorativa desde tempos imemoriais.
A rapaziada do BE alinhava pelo mesmo diapasão.
Estas duas mimosas formações políticas, idênticas nos métodos, semelhantes na recusa da Europa e das políticas daí derivadas, iguais na recusa de assumir responsabilidades políticas e mais iguais ainda na invenção de diferendos políticos internos, de purgas e expulsões (valha-nos o facto de vivermos longe no tempo e no espaço dos tempos abençoados da URSS e assimilados),conseguiram a partir da noite das eleições criar mais uma verdade científica, dialecticamente marxista leninista e historicamente materialista: a coligação de Direita perdera as eleições e a legitimidade visto não ter obtido a maioria dos votos dos portugueses. Por outras palavras, apesar de todas as dramáticas diferenças, apesar do ar farinhento e obsoleto de Costa, os eleitores do PC, do PS e do BE eram todos saídos da mesma pura e nutritiva farinha, melhor dizendo vinham todos do aconchego da mesma saca.
É isto que sob a alegada égide de Costa, refém dos seus novíssimos amigos, se prepara para dar um governo ao “torrãozinho de açúcar”. Com algumas subtis diferenças: o PC, mais cauteloso, vai assinar um papelinho mínimo que terá, daqui a meses, o destino de tantos outros papelinhos assinados por adversários que se detestam. O BE (sem base autárquica, sindical ou até social) menos experiente, mais ambicioso, sabendo de resto que só uma fatia de poder o pode ancorar na realidade política e social está por tudo e, já agora por um ministériozinho, por um par de direcções gerais, por umas administrações do exíguo e depauperado aparelho de Estado ou por umas empresas públicas, mesmo falidas (aliás quais são as que não o estão?).
Costa com a sua desesperada cavalgada autista não percebe (ou não lhe importa) que está a prazo a destruir o Partido para onde entrou (é ele que o repete até à exaustão) com a tenra e tonta idade de catorze aninhos.
Daqui a seis meses, um ano no máximo, este eventual futuro Governo que há quase um mês se prepara no silêncio dos gabinetes, escondido da comunicação social (e nisto um cumprimento: conseguiram não deixar transpirar para fora nada do que vão conversando. Ou então as conversações ainda não deram em nada de importante e construtivo) irá cair de maduro se não de podre. Com uma agravante: nestes tempos mais próximos –se forem verdadeiras as medidas de aumento da despesa e de diminuição da receitas de que se fala à boca cheia, recomeçaremos a trilhar os ínvios caminho s de um novo resgate numa lenta mas segura caminhada para a “albanização” de Portugal.
A segunda consequência desta trajectória “revolucionária” terá a forma de um duradouro e profundo definhamento do PS. E o consequente fortalecimento da Direita. Cumprir-se-á, em parte a premonição secreta de Jerónimo: a social democracia portuguesa poderá, consoante a dimensão do desastre, cair-lhe na algibeira sob a forma de um pequeno e inofensivo partido facilmente manipulável, uma espécie de “Os Verdes” sem a gritaria desenfreada da senhora deputada Apolónia (sempre é uma vantagem!).
D’Oliveira fecit