Quinta-feira, 13 de Abril de 2017

diario político 212

images.jpeg

Na esplanada entre sol e sombra

 

Hoje, os frequentadores da esplanada estavam assanhados. Falavam pelos cotovelos, sempre civilizadamente mas divergindo resolutamente.

A primeira conversa centrou-se no artigo de opinião de João Miguel Tavares (Público, ultima página) onde este questiona os patrocínios de uma biografia (2º volume) de Jorge Sampaio. Tavares reconhece que estão bem explícitas as menções aos patrocinadores (BPI, Fundação Oriente, Fundação Luso-Americana, grupo Visabeira, IPRI (Un Nova) Telecom e Mota-Engil!!!)

Tavares não questiona a procura e obtenção dos patrocínios, aliás bem explícitos na contracapa e na introdução da obra. Até elogia o esforço e a tenacidade de quem os procurou e conseguiu. Elogia também o facto de haver quanto a esta obra “mecenato cultural”. Todavia, depois dos elogios, surdem duas colunas que questionam quatro dos mecenas por estes não revelarem a um jornal o valor dos subsídios. E, cereja no bolo, Tavares também “acha estranho” que a FLAD. O IPRI e a FO se tenham “juntado” para criar uma bolsa destinada a apoiar a feitura de biografias de que, para já, apenas consta esta obra.

Tavares, comentarista que, aliás aprecio, acha esquisito que quer as fundações quer as empresas se fechem em copas sobre os montantes concedidos (Tavares chama a isto falta de transparência como se para alem dos relatórios e contas onde estes valores seguramente figurarão as empresas e as restantes instituições devessem andar a informar o excelentíssimo público sobre a largueza das suas benesses. Tavares,tão (e certamente bem) defensor do privado, do liberalismo, acha que toda a gente tem de saber e que todo o empresário deve prestar contas a estranhos. É que aqui não se trata de dinheiro dos cidadãos, mesmo se os patrocínios com mecenato possam, em diminuta proporção aliviar os impostos.

Tavares vem com o argumento de que Sampaio foi Presidente da República e que só isso, que ocorreu há uns bons dez anos é suficiente para indagar de como a sua biografia está a ser escrita. Arre! E que no meio das personalidades envolvidas pelo menos no que toca à bolsa há um antigo assessor de Sampaio (antigo de há mais de uma década...) Tavares, que escreve bem, muito bem, até, deixa no ar a ideia de que aqui há gato escondido. Que esta bolsa seria apenas um artifício para favorecer um idoso ex-presidente da República que agora exerce, alem fronteiras um trabalho internacional. E que isso, está nas entrelinhas, o compromete ou pode comprometer.

Eu, com a devida vénia, amigo de Sampaio desde os anos 60 (convém esclarecer para que não pairem dúvidas) tenho sobre esta obra de Castanheira um bem diferente parecer. É um tijolo! Um tijolaço. Uma tremenda chatice. Estas duas mil páginas, para o leitor comum poderiam ser trezentas ou quatrocentas desde que bem centradas no que realmente foi importante. E Sampaio foi importante, antes (sobretudo) e durante a Presidência. Com inteligência e rigor e um estilo menos pesado teríamos uma bela obra. Em Portugal, a biografia é terreno baldio e mal cuidado. Nesse capítulo que diferença com a Inglaterra, a França ou a Alemanha! Claro que não peço a Castanheira a verve, o espírito e a intelig~encia narrativa dum Stefan Zweig que tantas biografias deixou. A Zweig o que é de Zweig e a Castanheira o que entenderem.

Somos um país que desconfia de biografias ou de “memórias” (neste capitulo estou a lembrar-me já que se anda em comemorações de Raul Brandão das suas “Memórias” -que, por exemplo, com as José Relvas e o Diário” de João Chagas são fulcrais para se perceber os anos 10 a 30-). A última biografia que li com proveito foi a de Salazar por Filipe Ribeiro de Meneses que evita a maçadoria de ler os tijolos hagiográficos de Franco Nogueira. Ora aí está como com um terço do volume se faz bem melhor obra do que com as cerca de 2500 páginas de FN por muito meticulosas e esclarecedoras que estas sejam.

*** No mesmo local e pouco depois

Desta feita a conversa girou à volta das eleições para A Câmara do Porto. Ninguém conseguia perceber a razão que leva o PS a não se candidatar. Ou melhor, todos estavam de acordo que o primeiro motivo era evitar uma derrota igual ou maior do que a anterior.

Desde o malogrado regresso do dr Fernando Gomes que foi justiceira e friamente chacinado por Rui Rio, que o PS não sabe o que fazer no Porto. Não deixa de ser verdade que na cidade a Federação Socialista é uma espécie de clube de lutas de galos com a agravante de tal actividade ser ilegal, ilegítima e desacreditada. Com a gens socialista passa-se o mesmo. A rua não os conhece, as elites não os respeitam, os poucos socialistas que aparecem escafedem-se pelas esquinas. Não há uma ideia do PS para a cidade a menos que a governação de Rui Moreira a personifique. Os últimos candidatos socialistas à CML ou não ocuparam os seus lugares na vereação ou fizeram-no com tal discrição que deles não há memória. Nem boa nem má. Não existiram, ponto, parágrafo. Todavia, isso, essa arrastada e triste existência não pode servir de pretexto para desistir de aparecer. Por muito desgastada (e com razão) que seja a imagem do PS ela ainda consegue superar as dos dois outros parceiros da geringonça que também não atinam com a cidade. É verdade que, nas páginas mais folclóricas de um jornal citadino ainda se cobrem as declarações estertorosas dos vereadores da oposição mas, na generalidade a ideia que perpassa da irrisória actividade deles é que anda tudo na clandestinidade. Parafraseando: “assim se vê a força de não sei quê”.

Estas criaturas não riscam, não arriscam e muito menos beliscam os tradicionais poderes municipais. Ou então emigraram todos para outras paragens mais propícias e deixaram isto entregue a quem quiser fechar a luz e a porta.

Nem assim o PS se acha obrigado a ir à luta. Ou seja, assim nem valia a pena gastar dinheiro com o processo eleitoral. Ou então, pensam que sem oposição Rui Moreira não mobilizará a mesma multidão que o elegeu há quatro anos!...

E a conversa morreu mansamente, à dúbia luz coada pelas nuvens que anunciam uma eventual Páscoa molhada.

 

publicado por mcr às 19:48
link | comentar | favorito

Diario político 212

images.jpeg

Na esplanada entre sol e sombra

 

Hoje, os frequentadores da esplanada estavam assanhados. Falavam pelos cotovelos, sempre civilizadamente mas divergindo resolutamente.

A primeira conversa centrou-se no artigo de opinião de João Miguel Tavares (Público, ultima página) onde este questiona os patrocínios de uma biografia (2º volume) de Jorge Sampaio. Tavares reconhece que estão bem explícitas as menções aos patrocinadores (BPI, Fundação Oriente, Fundação Luso-Americana, grupo Visabeira, IPRI (Un Nova) Telecom e Mota-Engil!!!)

Tavares não questiona a procura e obtenção dos patrocínios, aliás bem explícitos na contracapa e na introdução da obra. Até elogia o esforço e a tenacidade de quem os procurou e conseguiu. Elogia também o facto de haver quanto a esta obra “mecenato cultural”. Todavia, depois dos elogios, surdem duas colunas que questionam quatro dos mecenas por estes não revelarem a um jornal o valor dos subsídios. E, cereja no bolo, Tavares também “acha estranho” que a FLAD. O IPRI e a FO se tenham “juntado” para criar uma bolsa destinada a apoiar a feitura de biografias de que, para já, apenas consta esta obra.

Tavares, comentarista que, aliás aprecio, acha esquisito que quer as fundações quer as empresas se fechem em copas sobre os montantes concedidos (Tavares chama a isto falta de transparência como se para alem dos relatórios e contas onde estes valores seguramente figurarão as empresas e as restantes instituições devessem andar a informar o excelentíssimo público sobre a largueza das suas benesses. Tavares,tão (e certamente bem) defensor do privado, do liberalismo, acha que toda a gente tem de saber e que todo o empresário deve prestar contas a estranhos. É que aqui não se trata de dinheiro dos cidadãos, mesmo se os patrocínios com mecenato possam, em diminuta proporção aliviar os impostos.

Tavares vem com o argumento de que Sampaio foi Presidente da República e que só isso, que ocorreu há uns bons dez anos é suficiente para indagar de como a sua biografia está a ser escrita. Arre! E que no meio das personalidades envolvidas pelo menos no que toca à bolsa há um antigo assessor de Sampaio (antigo de há mais de uma década...) Tavares, que escreve bem, muito bem, até, deixa no ar a ideia de que aqui há gato escondido. Que esta bolsa seria apenas um artifício para favorecer um idoso ex-presidente da República que agora exerce, alem fronteiras um trabalho internacional. E que isso, está nas entrelinhas, o compromete ou pode comprometer.

Eu, com a devida vénia, amigo de Sampaio desde os anos 60 (convém esclarecer para que não pairem dúvidas) tenho sobre esta obra de Castanheira um bem diferente parecer. É um tijolo! Um tijolaço. Uma tremenda chatice. Estas duas mil páginas, para o leitor comum poderiam ser trezentas ou quatrocentas desde que bem centradas no que realmente foi importante. E Sampaio foi importante, antes (sobretudo) e durante a Presidência. Com inteligência e rigor e um estilo menos pesado teríamos uma bela obra. Em Portugal, a biografia é terreno baldio e mal cuidado. Nesse capítulo que diferença com a Inglaterra, a França ou a Alemanha! Claro que não peço a Castanheira a verve, o espírito e a inteligência narrativa dum Stefan Zweig que tantas biografias deixou. A Zweig o que é de Zweig e a Castanheira o que entenderem.

Somos um país que desconfia de biografias ou de “memórias” (neste capitulo estou a lembrar-me já que se anda em comemorações de Raul Brandão das suas “Memórias” -que, por exemplo, com as José Relvas e o Diário” de João Chagas são fulcrais para se perceber os anos 10 a 30-). A última biografia que li com proveito foi a de Salazar por Filipe Ribeiro de Meneses que evita a maçadoria de ler os tijolos hagiográficos de Franco Nogueira. Ora aí está como com um terço do volume se faz bem melhor obra do que com as cerca de 2500 páginas de FN por muito meticulosas e esclarecedoras que estas sejam.

*** No mesmo local e pouco depois

Desta feita a conversa girou à volta das eleições para A Câmara do Porto. Ninguém conseguia perceber a razão que leva o PS a não se candidatar. Ou melhor, todos estavam de acordo que o primeiro motivo era evitar uma derrota igual ou maior do que a anterior.

Desde o malogrado regresso do dr Fernando Gomes que foi justiceira e friamente chacinado por Rui Rio, que o PS não sabe o que fazer no Porto. Não deixa de ser verdade que na cidade a Federação Socialista é uma espécie de clube de lutas de galos com a agravante de tal actividade ser ilegal, ilegítima e desacreditada. Com a gens socialista passa-se o mesmo. A rua não os conhece, as elites não os respeitam, os poucos socialistas que aparecem escafedem-se pelas esquinas. Não há uma ideia do PS para a cidade a menos que a governação de Rui Moreira a personifique. Os últimos candidatos socialistas à CML ou não ocuparam os seus lugares na vereação ou fizeram-no com tal discrição que deles não há memória. Nem boa nem má. Não existiram, ponto, parágrafo. Todavia, isso, essa arrastada e triste existência não pode servir de pretexto para desistir de aparecer. Por muito desgastada (e com razão) que seja a imagem do PS ela ainda consegue superar as dos dois outros parceiros da geringonça que também não atinam com a cidade. É verdade que, nas páginas mais folclóricas de um jornal citadino ainda se cobrem as declarações estertorosas dos vereadores da oposição mas, na generalidade a ideia que perpassa da irrisória actividade deles é que anda tudo na clandestinidade. Parafraseando: “assim se vê a força de não sei quê”.

Estas criaturas não riscam, não arriscam e muito menos beliscam os tradicionais poderes fácticos ou municipais. Ou então emigraram todos para outras paragens mais propícias e deixaram isto entregue a quem quiser fechar a luz e a porta.

Nem assim o PS se acha obrigado a ir à luta. Ou seja, assim nem valia a pena gastar dinheiro com o processo eleitoral. Ou então, pensam que sem oposição Rui Moreira não mobilizará a mesma multidão que o elegeu há quatro anos!...

E a conversa morreu mansamente, à dúbia luz coada pelas nuvens que anunciam uma eventual Páscoa molhada.

 

 

publicado por mcr às 19:42
link | comentar | favorito
Quarta-feira, 29 de Junho de 2016

diário político 209

Para que serve o referendo?

A senhora Catarina Martins proferiu um discurso muito aplaudido no convenção do seupartido. É normal. Os líderes são sempre muito aplaudidos digam eles o que disserem. Quando a feira encerra, estala o foguetório e toda a gente corre para apanhar as canas.

O BE está ainda em maré alta, fruto não tanto da real vontade de mudança dos portugueses mas tão só de uma aliança dirigida contra a Direita (ou o que exageradamente se considera como tal e espero nunca ver uma Direita a sério como por exemplo o PP espanhol ou os “republicanos” franceses). Se os leitores bem se recordam, o PSD/CDS ganhou as eleições mas Jerónimo de Sousa, um derrotado, conseguiu convencer António Costa outro ainda mais derrotado (face às espectativas) a inverter o resultado apostando numa aliança de que o primeiro tem sido o mais recompensado mesmo se o segundo esteja (supõe-se) tão só a ganhar tempo e espaço para sacudir os incómodos sócios e governar se conseguir (como espera) uma maioria nas próximas eleições que ocorrerão logo que o PS julgue poder ganhá-las.

Não referi o BE no anterior parágrafo mesmo que não ignore o seu expressivo resultado em votos e mandatos. Creio que tal votação assentou num voto de protesto contra a austeridade que terá mesmo mobilizado largas fatias de eleitorado “social democrata”. A perda do PPD não se transferiu só para o PS mas sobretudo para o BE num claro sinal de irritação e desconfiança de eleitores classe média que se sentiram “roubados” e não pensaram que tal voto fosse decisivo (e de facto, à luz dos costumes tradicionais na formação de governos não o seriam) para modificar a situação política.

Creio, também, que o BE (que todavia já sentira na pele o “efeito acordeão” de votações sucessivas e desencontradas) terá julgado que a sua súbita boa fortuna se devia à sua acção propagandística. Não deixa de ser curioso o facto deste partido não ter influência que se veja em sindicatos, movimentos sociais ou autarquias mas apenas lugares no parlamento.

Deixemos, entretanto, a curiosa vacuidade do BE e analisemos o discurso de Martins no que toca a um implausível referendo. A ingénua senhora não leu seguramente os tratados a que Portugal se obrigou no que toca às obrigações dentro da União europeia. Também não deve compulsarcom a devida frequência qualquer modesto dicionário de língua portuguesa como veremos.

Em primeiro lugar, seria bom esclarecer a fogosa líder bloquista do irremediável facto de, ao não cumprir os limites impostos do deficit, haver lugar a sanções. A coisa está bastamente escrita e já foi glosada de todas as formas e feitios. Quem não cumpre come com uma multa. Ponto final.

Se tal multa tem, ou não, sido aplicada como se deve é outra questão e suscita problemas diferentes que poderão, ou não, sugerir um pedido português para escapar ao estipulado.

Vir agora, em tom arrebatado, exigir da Europa outra atitude (ou melhor dizendo, sic: (não) aplicar uma sanção inédita, inaceitável e provocatória pelo mau desempenho das contas” do anterior Governo) ameaçando “pôr na ordem do dia um referendo para tomar posição contra a chantagem”.

Desconhece-se, provavelmente por mau feitio próprio, onde reside a chantagem e sobretudo em que é que uma sanção regularmente prevista pode ser provocatória, inaceitável ou sequer inédita.

Reside neste grupo de palavra aquilo a que, enquanto cidadão pagador de impostos (de onde uma parte vai para o parlamento para pagar as tropelias discursivas de dona Catarina & coleguinhas), este cronista chama  ignorância pura da língua nacional e do significado das palavras que a senhora Martins usa.

Depois, é patética a ideia de convocar um referendo sobretudo quando tal atitude envolve a direita mais sinistra e canastrona que a europa vai segregando, graças também, é bom recordá-lo, às tolices de uma esquerda que vem do passado mais estalinista e vergonhoso, duma esquerda que nada aprendeu mas tudo esqueceu.

Claro que, depois da ameaça infantilóide e ridícula, mais nehuma força política se moveu, sequer mostrou especial indignação. Aquilo, aquele arroto de histeria política, ficou dentro da sala congressional e, pelos vistos, nem aí foi tomada muito a sério.

O país, embriagado pelo sucesso futebolístico contra a Croácia, também não pestanejou. Duvido mesmo que tenha sequer ouvido o apelo de Martins, o histérico nacionalismo bacoco que representa e a crassa ignorância do que está em jogo.

A senhora Catarina Martins não gosta da União Europeia. Como a senhora LE Pen em França, acrescente-se ou como outros variados eurocépticos que juntam a essa fobia outras mais quais sejam um sólido horror aos estrangeiros, ao capital ou aos imigrantes que não querem suportar.

De todo o modo, tem sido a União Europeia, as organizações inter-estaduais e comunitárias que a antecederam que são o garante da paz e do bem estar dos europeus. Portugal, pese a sua pequenez é um beneficiário líquido da União quer em fundos quer em acolhimento de milhões de emigrantes que na UE trabalham, prosperam e são respeitados.

Vir agora com farroncas e ameaças vãs e parvas é apenas, isso sim, algo de vagamente provocatório quer para os europeus quer para os cidadãos portugueses que aturam benevolentemente os espirros assanhados de Catarina. Os primeiros nem lhe ligam e os segundos, nós, têm direito a não serem incomodados por quem não fala em nome deles se é que fala em nome de alguém.

É tempo de Catarina crescer se é que isso (politicamente) ainda é possível.

E de ler os tratados e, já agora, de passar as mãos pelo dicionário. Nem que seja o da Academia, o tal que terminava no fim da letra A.

d'Oliveira fecit, 27 Jun 206

 

publicado por mcr às 10:38
link | comentar | favorito
Sexta-feira, 8 de Abril de 2016

Diário político 207

images.jpeg

 

Ódio velho não cansa*

ou

17 anos é muito tempo

 

(declaração de interesses: sou amigo de Augusto Seabra desde 75/76. Cruzei-me com ele numa aventura política, o MES, e posteriormente fomo-nos encontrando e desencontrando em sessões de cinema, concertos, livrarias, idas ao teatro para não falar em bares onde se reinventava o mundo. Tenho-o por uma das pessoas mais cultas e mais honestas que conheço. Nunca vendeu a pena por favores, conhecimentos ou compadrio. Nunca se vendeu, coisa bem rara hoje em dia. Ler Seabra hoje é, rigorosamente, lê-lo há vinte, trinta ou mais anos, pese embora um que outro ajuste que o tempo e os autores também mudam, muitas vezes para melhor. Quisesse Seabra vergar a espinha ou refrear a língua e hoje era rico e famoso. )

 

O sr. João Soares é, para surpresa de muitos, espanto de todos e vergonha nacional, ministro da Cultura. Conseguiu-se, assim, provar que depois de Carrilho, outro valentaço, e da inominável senhora Canavilhas, havia ainda lugar a pior, muito pior. Estas duas criaturas, três se contarmos o sr. Soares, fazem ter saudades de Santana Lopes, o que não é dizer pouco.

A que vem, contudo, esta chamada do insignificante Soares às páginas deste blog? Pois muito simplesmente a uma sua antiga (e reactualizada) promessa de ferrar dois bofetões na cara escanzelada e antiga de Augusto M Seabra.

Ao que parece a promessa das “lambadas” vem de 1999, isto é do século passado!!!

Há 17 anos que este para de “lamparinas” está prometido ao crítico. 17 anos é muito tempo, tempo a mais. Se as prometidas e incumpridas estaladas tivessem o mesmo juro dos dinheiros públicos a coisa, por esta altura traduzir-se-ia num “arraial de porrada”, numa sarabanda tremenda e medonha que transformaria a face esmaecida de Seabra numa waste land, caso nos seja permitido citar T.S . Elliott, poeta que, eventualmente, o sr Soares conhecerá pois há várias e antigas traduções portuguesas.

É que, vejamos, uma promessa de dois tabefes feita em 1999, e depois acintosamente postergada por quase dúzia e meia de anos, é um cúmulo, uma falta de educação, uma ofensa. Então alguém torna-se credor de uma agressão anunciada aos quatro ventos e passa seta carrada de anos sem que as ventas se avermelhem pela marca de quatro dedos?

Como é que é possível que o heroico sr. Soares nunca tenha conseguido lobrigar o temível Seabra que, como o doce da Teixeira, está sempre visível em tudo o que mexe culturalmente?

Será que promitente agressor se desencontrou inexplicavelmente com o putativo agredido em todas estas centenas de oportunidades? Meditemos: enquanto se Seabra acode a S Carlos para a ópera, está Soares numa corrida de toiros em Salvaterra. Se acaso é uma vernissage na S Mamede, está Soares numa sessão de bingo em Caneças. Se é na Gulbenkian que acontece um concerto, anda Soares pelo Intendente a comprar caril em pó. Sempre, acrescente-se, na pista do crítico que pelos vistos o insulta copiosamente desde esses longínquos anos noventa. Já é azar! Que digo, azar?. É um “galo” tremendo, máxime um “crespo” infernal, uma maldição, um desconsolo, uma úlcera no duodeno, uma fístula no dito cujo, um ataque de hemorroidal medonho que nenhum medicamento susta, assusta ou socorre.

Anda, pois, uma criatura por aí, munida de um par de mãos desocupadas, com luvas cirúrgicas para calçar no momento em que, finalmente, aleluia!, glória!, viva, viva, viva!, der pelo evanescente crítico e lhe arrear o prometido (e devido) exemplar castigo, com os juros de tantos e tão sofridos anos, e nada!

Ao longo de muitas décadas, dei comigo a não falar com duas (2) criaturas. Nunca me lembrei de lhes prometer, pública ou privadamente, um “enxerto de porrada”, sequer um canelão ou um mero olhar enviesado. Deixei, pura e simplesmente de as conhecer e nem sequer os avisei disso. Não valia a pena comunicar a tais insignificâncias que passavam à orwelliana categoria de “unpersons”, de invisíveis, ou de translúcidos, na melhor das hipóteses. Pois querem acreditar que volta que não volta, me topo com as desgraçadas criaturas, mesmo se de há muito deixei de frequentar os lugares que elas assombram? Até na esplanada da Brasileira encontrei uma delas. Outra que jamais manifestara disposição para acordar cedo, passou a frequentar uma esplanada frente ao mar onde durante uma boa dúzia de anos nunca a vira, tanto mais que distava um bom par de quilómetro do antro onde vivia. Arre!

Pessoa amiga que acabou de ler parte deste texto tentou uma explicação: Soares nunca teve por objectivo passar da palavra ao acto (Ele próprio terá escrito que é um homem pacífico e nunca se envolveu em zaragatas pelo que pediria desculpa se tivesse assustado alguém). Pior a amêndoa do que o sorvete! Então anda por aí a distribuir putativas bofetadas e, quando alguém lhe reprova a fúria sanguinária, logo lhe passa a ira, o desejo de desforço, a ameaça trauliteira e eis que de águia passa a galinha pedrês, num cocorico blandicioso e deferente?

O sr Soares não tem condições (nunca teve) para ser ministro seja do que for. É um erro de casting, uma tropelia de mau gosto e pior falta de senso, por muito que isto se pareça com uma república bananeira ou, como (se bem recordo) apontava Eça, através de um seu cónego, um jardim, um “torrãozinho de açúcar”.

Parece que Seabra lhe apontava umas cumplicidades maçónicas sugerindo que ele proteia gente da sua “loja”. Sem desprimor para os cada vez mais raros profissionais do ramo, entendo que Soares só combina com loja na qualidade de marçano aprendiz.

Antes isso que aprendiz de feiticeiro!

No meio desta tola bravata, Soares terá também anunciado umas salutares bofetadas em Vasco Pulido Valente. A distancia que vai dele a VPV mede-se em anos luz de inteligência, cultura, humor, talento para escrever e biografia. Não importa. VPV placidamente e em três palavras retorquiu “cá o espero”.

Nas redes sociais é o delírio: centenas de pessoas riem, gargalham, retorcem-se agarradas à barriga e caem desamparadas no metafórico chão dos twiters s dos facebooks. eu também riria se a coisa não se passasse no meu país e no seio do Governo que   o rege. Haja a decência de o mandar para lugar onde não incomode. Por exemplo: consul em Pyong-Yang. Boa viagem!

* Velho ditado e título de um romance de Rebelo da Silva

d'Oliveira fecit

 

publicado por mcr às 19:04
link | comentar | favorito
Sábado, 7 de Novembro de 2015

diário político 207

images.jpeg

 

A corrida dos lemings para o abismo

 

Há lá para as zonas frias um bicharoco simpático e pequeno que a tradição popular assegura que se suicida em massa em certas alturas. Claro que tal teoria é falsa mas, na verdade, o mito dos lemings em corrida para o abismo tem vida dura e serve bem de exemplo parao que se passa com a rapaziada do PS de Costa.

Por razões que agora me dispenso de pormenorizar, um tempo houve em que fui militante do PS. O partido tinha acabado de averbar uma valente derrota e um velho amigo meu convenceu-me a ir dar o corpo ao manifesto.

Relutantemente, lá me dispus a fazer toda a via sacrificial desde comparecer disciplinadamente às reuniões da secção (como sou pontual era o primeiro e vezes houve que aguardei na rua que alguém chegasse com uma chave para entrar e esperar. Só isso já me chegaria para deixar a militância mas eu era novo (enfim, semi-novo) e queria ajudar.

Para minha surpresa, as reuniões eram algo de surpreendente. Não se discutia política e no que toca à teoria aquilo andava abaixo de zero. Não havia naquela abençoada secção uma criatura que não jurasse por dos pequenos barões da cidade e isso, pelos vistos, substituía a ausência de qualquer ponto de vista teórico. Aquilo parecia a cabecinha do dr João Soares em dia de discussão política. Um horrendo vácuo!

Como tinha algum à vontade e sabia quem eram Antero de Quental, Marx e Proudhon rapidamente subi na consideração dos meu camaradas de tal modo que em poucas semanas era delegado a um congresso da federação e candidato a um lugar decente na respectiva comissão política.

Por razões novamente inúteis lá cumpri a minha tarefa no Congresso mas recusei a honra imerecida de ir para a dita comissão. Mais tarde ainda me quiseram para vereador ou, caso recusasse, para deputado municipal. Recusei outra vez não só porue não queria abandonar o trabalho que tinha e não me seduzia a parlamentarite camarária. ainda fiz parte de um grupo de pessoas que votaram Vitor Constâncio (mea culpa, mea culpa, mea máxima culpa) mas quando o PS embarcou na moção daquele desastrado Partido Renovador Democrático contra o PPD de Cavaco Silva, deixei de pagar cotas esperando que os competentes órgãos do partido me expulsassem por dívidas. A coisa demorou anos (como se vê a organização era primorosa) mas finalmente pude participar no Conselho Coordenador dos “Estados Gerais” de Guterres como independente.

A tal situação devo um gentil convite para uma mordomia cultural bem paga que obviamente recusei. Mais tarde recusaria mais um par de cargos cuja designação atribuí, por boas ou más razões, à minha familiaridade com alguns membros do Governo. À cautela preferi continuar onde estava e não ser alvo de algum dedo apontado.

Durante todo este tempo, fui verificando que o PS era um aglomerado de pessoas cujas coordenadas político –ideológicas apenas se verificavam na elite do partido. E mesmo assim a coisa não era famosa. soares, Zenha Sampaio, mais uns quantos sabiam ao que andavam. O resto ou era vagamente anticomunista, eventualmente democrata e seguramente contra os ricos. Pouco mais. No campo do anticomunismo se razões havia e são tantas e tão dramáticas quanto a história da Esquerda depois do nascimento da Terceira Internacional (o famoso Komintern), não era por aí que ele se manifestava e orientava. O PS português era uma mistura do republicanismo histórico e “democrático” (de Afonso Costa) da efémera Esquerda republicana dos fins da 1ª República, de mações aventalistas e outra gente (a melhor) que vinha do “reviralho” anti salazarista. Fundamentalmente, dominava a classe média (baixa e média com muita predominância de bancários e outros grupos profissionais afins), professores e rapazes cheios de ardor por bons lugares. Não se via um empresário, sequer um industrial e quando se caía numa discussão sobre as finanças nacionais aquilo era um nevoeiro mais espesso do que o de Alcácer Kibir.

Depois de sair do PS pela porta de serviço, continuei a dar-lhe o meu pobre voto: não havia alternativa capaz à Direita (Credo! Jesus, Maria, José!) e muito menos à Esquerda onde, nesse tempo ainda pregava Pacheco Pereira e um patusco Clube da Esquerda Liberal, a UDP com um solitário deputado no Parlamento, uma sucursal da IVª Internacional traduzida do francês, mas em calão (a LCI), e o “partidão” sempre guiado por Cunhal (e antes por ele –que ao menos sabia ao que vinha, era culto e ideólogo – do que pelos seus minúsculos sucessores!...).

Que o PS e alguns dos seus iluminados líderes andava desnorteado foi visível a partir dos finais do século XX. como política preferiu propor aumento da dívida com recurso a empréstimos “baratos” não reparando em coisas tão simples quanto a estagnação industrial, a baixa continua do PIB em relação ao aumento dos encargos do Estado, enfim, parecendo desconhecer que os milagres keynesianos que pretendia repetir nem sequer nos EUA tinham dado os resultados pretendidos. Foi a guerra e a tremenda expansão industrial que as necessidades militares provocaram, que finalmente tirou o país da boa parte da crise. Keynes deve ser usado e/ou invocado cum grano salis mas isso foi areia demasiada para a prodigiosa cabecinha do senhor “engenheiro” Sócrates e de deu no que tinha quedar: um estoiro cujos ecos e réplicas ainda se ouvem e que provavelmente irão de novo soar imparavelmente sob a batuta de Costa se a mescambilha que prepara for para a frente.

Tudo indica que irá pese o pouco que se sabe do PC.

Para o efeito, entretanto algumas criaturas do PS tem desenvolvido nos jornais, mormente no “Público” alguns argumentos cuja debilidade teórica só é comparável à ignorância histórica que demonstram. A começar por uma respeitável senhora que se afirma mais perto do BE e do PC do que da coligação não se percebendo bem o que isso quer dizer (será a senhora leninista, assumirá como seu o argumento de que a Europa é risível, o euro uma imposição de algum deus nórdico (Thor, Odin?) o défice abaixo dos 3% um papão capitalista e as diferentes versões da famosa “Klasse gegen Klasse” e dos seus sinónimos (social traidor, social fascista) com que os comunistas sempre qualificaram os seus camaradas –isto no caso de ser militante do PS-, terá já, num arrebatamento iluminado, esquecido que durante toda a campanha eleitoral (e, desde sempre, antes) os qualificativos com que o PS foi brindado poe Jerónimo e acólitos? Recordará, porventura, a guerrilha anti-Guterres, a defenestração de Sócrates e a continua desqualificação política, ética e cultural que o PC em nome da “verdadeira Esquerda” sempre bolsou sobre os seus eventuais companheiros de partido?

Num tom menor (se bem que mais responsável por vir de um dos jovens turcos de Costa) surdiu outro esmagador argumento: o PPD (mailo CDS) ter-se-iam afastado do “centro”. Esta afirmação delirante merece um comentário. Para o jovem Pedro Santos (ou algo do género) o PPD e o CDS estiveram no centro mas depois abandonaram-no. Suponha-se que Santos, o “teórico” apenas queria referir o PPD mesmo se, ao que vamos vendo, o CDS se apresente com alguma razão como um partido democrata cristão, se é que ainda alguém se preocupa e sabe o que isso é.

Se o PPD esteve ao centro onde é que estava o PS cujo percurso, medidas e argumentário em quase nada se diferenciou daquele. À esquerda? De quê e de quem? Santos, pelos vistos acha que há em Portugal uma imensa multidão à direita. Vê-se que a criatura não sabe o que é um partido conservador a sério. Provavelmente não sabe francês, inglês, espanhol ou italiano (já não se lhe pede alemão) onde os Cameron, os Sarkozy – nem refiro a criatura Le Pen- os Berlusconi ou o enigmático galego aqui do lado (e o senhor Mas na Catalunha ou a gente que governa os bascos) pois se soubesse, se lesse, se ao menos ouvisse os noticiários estrangeiros alguma coisa aprenderia se é que na suave cabecinha que usa (presume-se) alguma ideia consegue entrar para além da imensa vontade de governar, de começar a ganhar a vidinha com um governo de feição.

No meio desta barafunda, onde os socialistas (ou alguns deles) estão contentíssimos por entrar na categoria (marxista-leninista stalinista) dos compagnons de route, vulgo “inocentes úteis”, verdadeiramente “idiotas úteis” (Stalin dixit), enfim nos lemings lendários e suicidários, só o PC (apesar de tudo um partido com história, memória e convicções fortes) mostra alguma coerência: pode ser que acabe (a minha presunção é qua acaba) por assinar um acordo mínimo com o PS. Todavia, repare-se que ao fim de um mês aquela máquina política irrepreensível ainda anda a tentar digerir o “sapo” (ou o elefante, é uma questão de perspectiva) que terá de engolir. Um inteiro mês!

(fica por analisar a posição do BE: não vale a pena gastar muita cera com tão ruim defunto: à uma cresceu à custa de uma milagrosa transferência de votos claramente de protesto que amanhã irão para ou sítio, sumir-se-ão sem apelo nem agravo. Já se viu o mesmo com o partido eanista de má memória, um cometa breve e irrelevante na política nacional. Depois, e é essa a razão da existência de uma franja esquerdista à esquerda do PC, aquilo é gente que quer um lugar à mesa do orçamento e anda nisso há que tempos. A mouvance trotskista sempre teve uma ideia fixa: o “entrismo” nas zonas sindicais e no aparelho autárquico. Até agora, por cá, nunca o conseguiram: a sua clientela fixa é feita de jovens urbanos desenraizados e indignados que mesmo sendo muitos não estão ligados às tradicionais máquinas militantes. Estar com um pé no poder é uma hipótese aliciante por todos os motivos: há empregos, há permeabilidade possível para entrar nos aparelhos que lhes estão fechados e há, esquecia-me a fé.

A mesma fé que fez o sr padre Silva abandonar as estruturas da Igreja para professar num convento bem mais radical e autoritário como é o comité central do PCP galvaniza comoventemente as criaturas bloquistas

Que o PS de Costa não veja isto, não me admira: o homem só tem uma solução: depois de uma derrota retumbante nas eleições legislativas só a conquista do governo alicerçada numa coligação contra natura o salva do linchamento pelos seus pares. Ou melhor: não o salva, apenas adia. Daqui a meia dúzia de meses, máxime, um ano, cá estaremos para o verificar. Entretanto lá nos iremos “albanizando” (de Albânia a risonha pátria de Enver Hodja que Deus tem e que foi o farol daquele cinzento sr Fazenda que por aí anda sumido e esquecido graças a uma boa dúzia de mulheres bloquistas que ao lado dele parecem ainda mais inteligentes do que na realidade são.)

 

nota 1: não refiro Assis. Se por um lado nunca fui muito à sua missa, por outro, recordo com respeito a atroz via sacra que, como dirigente socialista, cumpriu na terra da srª Fátima Felgueiras. Foi corajoso e foi digno. ´É inteligente e, pelo menos, parece conhecer melhor a história do PS (e o seu eventual ideário) do que toda a gente acima referida.

nota 2: a ilustração de hoje é uma obra de Pancho Guedes, um arquitecto único e irrepetível que acaba de morrer. Tristan Tzara não se enganou quando o reclamou como “o grande arquitecto dada”. Foi isso e mais até: protegeu e lançou artistas que sem ele dificilmente teriam tido percurso quanto mais êxito (Malagantana, por exemplo) Moçambicano por adopção deixa uma extraordinária colecção de “arte negra”, das melhores de Portugal que, espera-se, cá ficará para glória e honra nossa. Pancho, o Panchicho dos tempos de familiares meus em S Tomé, mereceria como Marcel Griaule há anos ou Jean Malaurie (ainda vivo ) que o povo que ele amou o enterre e o recorde. A África merece Pancho e Pancho merece-a absolutamente.

d'Oliveira fecit 

 

 

publicado por mcr às 19:42
link | comentar | favorito
Quarta-feira, 4 de Novembro de 2015

diário político 206

30a.jpg

 

Os amanhãs que não cantarão...

 

... “And I see through the windows like I see through the lies


Like I see through every useless disguise


That everyone wears but everyone swears that they don't


Oh and don't mind me baby, I'm only dying slow…

 

A ambição descomedida de um político que conseguiu perder uma eleição que estava ganha há anos; a deriva pouco inocente de um percurso que nunca fora o da esquerda socialista; a capacidade (manhosa) de transformar críticas anteriores aos seus predecessores (as vitórias que sabiam a “poucochinho”) em derrotas que sabem a muitíssimo são, a partir de agora, virtudes políticas.

Costa, perdida a eleição poderia pelo menos ter salvo a honra. Mesmo que eu não aprecie por aí além o discurso de corda ao pescoço com que os políticos em desgraça se dirigem aos seus eleitores, tão pouco aceito as fugas para a frente que esta pseudo “frente popular” que se anuncia.

Costa defenestrou Seguro mesmo depois deste ter ganho umas eleições autárquicas e outras europeias.

Seguro não era grande espingarda mas, pelo menos, durante o consulado de Sócrates, nunca se comprometeu com a política suicidária dos dois governos PS, mormente o último onde o escândalo só foi ultrapassado pelo desastre económico e financeiro. É verdade que Seguro, estava refugiado na última fila do hemiciclo, calado que nem uma lapa neurasténica. É verdade que o silêncio (que dizem tolamente ser de oiro) é apenas silêncio. Mas no meio do vozear informe dos seguidores de Sócrates esse silêncio era pelo menos grave e apelava sem sucesso a uns segundos de serenidade.

Sócrates caiu pela acção conjunta da Direita (que apesar de tudo lhe permitira governar – como antes fizera em relação a Guterres seguindo o entendimento que tal tarefa compete ao partido mais votado)e da Esquerda entusiástica do PC e do BE.

Parece que, na altura, nenhum dos ultrademocráticos dirigentes destas duas formações se lembrou de estar a ajudar (e de que maneira) a temível Direita “ultraliberal”. Parece, igualmente, que nenhuma destas luminárias tinha noção dos programas da Direita a quem tão generosamente abriam escancaradamente as portas da governação.

Diga-se, em boa verdade, que no mesmo erro não caíram a dr.ª Ferreira Leite e o dr. Pacheco Pereira. Estes, movidos pela amargura de uma retumbante derrota interna, pela pesporrência e pela alta ideia que têm de si mesmos começaram logo a questionar Coelho. Esta gente além do ego monstruosamente inflacionado tem a memória longa e a dor de corno perpétua. Como aliás se vai vendo e (quando há pachorra) lendo.

Durante a campanha eleitoral, PC e BE brindaram Costa e o PS com uma espantosa girândola de epítetos desqualificantes. A la rigueur só não lhe chamaram “fascista” porque a palavra, de tão usada, perdeu qualquer efeito revulsivo.

Costa, no dizer estalinistoide de Jerónimo, era “farinha do mesmo saco” de Coelho. A expressão é pejorativa desde tempos imemoriais.

A rapaziada do BE alinhava pelo mesmo diapasão.

Estas duas mimosas formações políticas, idênticas nos métodos, semelhantes na recusa da Europa e das políticas daí derivadas, iguais na recusa de assumir responsabilidades políticas e mais iguais ainda na invenção de diferendos políticos internos, de purgas e expulsões (valha-nos o facto de vivermos longe no tempo e no espaço dos tempos abençoados da URSS e assimilados),conseguiram a partir da noite das eleições criar mais uma verdade científica, dialecticamente marxista leninista e historicamente materialista: a coligação de Direita perdera as eleições e a legitimidade visto não ter obtido a maioria dos votos dos portugueses. Por outras palavras, apesar de todas as dramáticas diferenças, apesar do ar farinhento e obsoleto de Costa, os eleitores do PC, do PS e do BE eram todos saídos da mesma pura e nutritiva farinha, melhor dizendo vinham todos do aconchego da mesma saca.

É isto que sob a alegada égide de Costa, refém dos seus novíssimos amigos, se prepara para dar um governo ao “torrãozinho de açúcar”. Com algumas subtis diferenças: o PC, mais cauteloso, vai assinar um papelinho mínimo que terá, daqui a meses, o destino de tantos outros papelinhos assinados por adversários que se detestam. O BE (sem base autárquica, sindical ou até social) menos experiente, mais ambicioso, sabendo de resto que só uma fatia de poder o pode ancorar na realidade política e social está por tudo e, já agora por um ministériozinho, por um par de direcções gerais, por umas administrações do exíguo e depauperado aparelho de Estado ou por umas empresas públicas, mesmo falidas (aliás quais são as que não o estão?).

Costa com a sua desesperada cavalgada autista não percebe (ou não lhe importa) que está a prazo a destruir o Partido para onde entrou (é ele que o repete até à exaustão) com a tenra e tonta idade de catorze aninhos.

Daqui a seis meses, um ano no máximo, este eventual futuro Governo que há quase um mês se prepara no silêncio dos gabinetes, escondido da comunicação social (e nisto um cumprimento: conseguiram não deixar transpirar para fora nada do que vão conversando. Ou então as conversações ainda não deram em nada de importante e construtivo) irá cair de maduro se não de podre. Com uma agravante: nestes tempos mais próximos –se forem verdadeiras as medidas de aumento da despesa e de diminuição da receitas de que se fala à boca cheia, recomeçaremos a trilhar os ínvios caminho s de um novo resgate numa lenta mas segura caminhada para a “albanização” de Portugal.

A segunda consequência desta trajectória “revolucionária” terá a forma de um duradouro e profundo definhamento do PS. E o consequente fortalecimento da Direita. Cumprir-se-á, em parte a premonição secreta de Jerónimo: a social democracia portuguesa poderá, consoante a dimensão do desastre, cair-lhe na algibeira sob a forma de um pequeno e inofensivo partido facilmente manipulável, uma espécie de “Os Verdes” sem a gritaria desenfreada da senhora deputada Apolónia (sempre é uma vantagem!).

D’Oliveira fecit      

publicado por mcr às 11:10
link | comentar | favorito
Terça-feira, 6 de Outubro de 2015

Diário político

images.jpeg

 

Calma, malta! Isto não o fim nem o princípio de coisa nenhuma

É só fumaça!

 

Vamos por partes.

Quarenta e três vírgula sete por cento dos portugueses não se deram ao trabalho de ir votar.

Três vírgula sete por cento votou branco ou nulo.

Dos cinquenta e quatro por cento restantes há os resultados que se conhecem. Há, é um modo de dizer. Ninguém garante que os cadernos eleitorais não continuem pejados de fantasmas, de mortos e enterrados que por inércia não foram varridos dos mapas.

 

Seria bom que os cavalheiros que abrem a boquinha para em nome dos seus partidos (sempre vencedores, ou quase: só o PS confessou a derrota. O resto ganhou tudo. Vão todos à taça dos campeões, ou algo do mesmo género e substância!) proclamam êxitos piramidais fizessem o grande favor de não emitirem opiniões sobre o estado de alma do povo português e do seu ódio medonho aos senhores Coelho e Portas. Pede-se serenidade, e calma à rapaziada que se entusiasmou demais.

Apenas os votantes disseram o que queriam. Mesmo que se não presuma que os não votantes estão de acordo com o Governo convirá não ver na sua abstenção um sinal contra o PAF. De facto, mesmo se o voto não é obrigatório, irou não ir pôr o papelinho na urna é, também um acto político.

E agora os partidos:

Um pequeno e simpático grupo obviamente mais ecologista do que a senhora Apolónia, entrou no Parlamento. Saliente-se o feito tanto mais que essa entrada coincide com o afocinhamento dos deliquescentes ex-bloquistas, do eterno MRPP, e do senhor Marinho e Pinto. Só isto, a derrota desta criatura, já é uma prova do bom senso dos portugueses que anteriormente o tinham sufragado à boleia de um partido que ele, uma vez eleito abandonou miseravelmente.

O BE (esquecido dos tempos em que, de faca nos dente,s uivava pelo Syriza e prometia uns amanhãs cintilantes de sangue e sirtaki) conseguiu apanhar todos os indignados que por aí andavam órfãos e muitos eleitores do PS que acusavam o partido de coisas inomináveis.

Já agora, convém saber se todos estes eleitores subitamente bloquistas estão de acordo com as teses do partido sobretudo as que tratam da Europa, do euro, da mundialização etc...

Se, por acaso, mero acaso, não estão, então não me levem a mal: enganaram-se no voto, desperdiçaram-no e nem sequer conseguiram com isso a tão miraculosa unidade da esquerda. Tal situação continua a ser uma miragem no deserto e nem Santo Antão o Cenobita vale aos que pedem, como o derrotado Tavares (hoje, no “Público”) unidade, unidade e mais unidade. Como era um entusiasta da unidade Tavares formou um partido a juntar ao copioso número dos que já existiam...

Destes votos de descontentes com o Governo que desaguaram no BE, extrai-se outra conclusão. No seu afã de esmagar o governo “ultra-liberal” desarmaram o único partido que, apesar de tudo (e eu não votei no PS) poderia derrotar o PAF! É obra!

O PC, solitária voz que também clama no deserto onde desde sempre se acoitou, viu-se ultrapassado pelo BE. De todo o modo cantou vitória. Canta sempre. Desta feita celebra três mil e tal votos a mais. E veio solenemente recordar ao povo amigo que sessenta por cento dos eleitores rejeitaram o PAF.

Esqueceu-se, o PC, pouco dado a contas de subtrair e somar, que noventa por cento dos mesmos eleitores o rejeitaram a ele!

De todo o modo, o PC segurou os seus eleitores, manteve a sua área de influência e deu outra vez boleia a uma coisa inexistente chamada “os verdes” que serve sempre para dizer no Parlamento alguma coisa que o PC acha não dever dizer.

O PS, pela voz de Costa (e confesso que o admirei!...) veio dizer que perdeu! Caramba, homem, isso é a única coisa que se não diz! Ou se o dizemos, logo de seguida, arranjamos uma desculpa, repartimos as culpas. Tivesse Costa usado da mesma linguagem na campanha, outro galo lhe cantaria. Agora, ali está, desafiando os adversários internos, a sair da toca (alguém os viu na campanha? Não? Eu também não os lobriguei. Mas vão aparecer para uma noite vagamente de “facas longas”). Há, porém um problema: não se vislumbra, naquela contestária arruaça ninguém com peso, percurso e autoridade, para enfrentar Costa. Ou alguém acha que o senhor Álvaro Beleza, uma sublime insignificância, ou a senhora Ana Gomes, anteontem tão chorosa, são capazes de ir a jogo?

A ideia, bronca e trucidadora, de que mal há uma derrota se deveMas substituir o líder prova a nossa inenarrável incultura política.

E os vencedores? Para a oposição impotente, eles foram derrotados por não conseguir a maioria absoluta! Não tenho, por mera culpa minha, mau feitio e neurasténico pessimismo, qualquer simpatia por Portas ou por Passos. O defeito é meu, claro.

Todavia, lembraria algum leitor mais indignado, que ali por Abril, Maio, Junho, mesmo Julho, não havia ninguém que não augurasse uma tremenda derrota da coligação. Estão feitos, dizia-se. Confesso que, por desfastio, apostei um par de almocinhos na vitória da coligação. Mas esperava perder...

Pertenço ao escasso grupo de pessoas que gosta, mesmo com o risco de perder a aposta, de contrariar os politicamente correctos e, mais ainda, os que acham que a política pede muita fé, muito entusiasmo, muita arruada e muita colagem de cartazes. E pouca, nenhuma, reflexão. O povo, para muitos destes cavalheiros, é uma abstração. O povo por quem eles, arrogantemente, pensam, ou julgam pensar.

Ora bem: nada disso ocorreu. O povo ordeiro e composto não está convosco!

As pessoas anseiam por segurança, estabilidade e detestam a aventura. E o desconhecido. Apanharam no lombo com uma carga de varapau de austeridade. Começaram, mal ou bem, a ver uma pequeníssima hipótese de melhorar a vida. Como a heroína de Gil Vicente, preferem “asno que os carregue do que cavalo que os derrube”. Conviria a um par de excelentes amigos meus reler os clássicos. Todos os clássicos e não apenas Mestre Gil. E a História pátria, a boa e não a panfletada que por aí corre a título de boa e progressista.

Desculpem esta tirada populista mas eu andei numa escola recheada de gente muito pobre e mantive durante muitos anos contactos com esses colegas humildes que fizeram pela vida, subiram a pulso, puseram os filhos a estudar, não recuaram perante nenhum sacrifício, emigraram, souberam o que era dividir uma sardinha por dois. Essa gente vota. Mesmo sem ter feito o liceu e, muito menos a universidade sabem da poda, da política e da propriamente dita. E sabem defender os seus interesses.

Agora, diz-se, abre-se um novo ciclo político. Nem tanto, nem tanto. Governos minoritários tivemos já uma boa meia dúzia. Soares esteve minoritário, Cavaco idem, Santana Lopes e Guterres e até o inefável Sócrates cuja sombra perpassou pela campanha e prejudicou largamente o PS. De cada vez que Soares ia visitar o “preso político” (só em Portugal é que alguém sem corar diz esta barbaridade e não é imediatamente chibatado pela imprensa!) os cidadãos escaldados viam nisso um recado de e para o PS.

De todos os governantes minoritários, destacam-se Soares que soube dar a volta ao texto e Cavaco (a quem todos atiram pedras e pedregulhos...) que aproveitou as burrices dos adversários para firmar a mais longa carreira de primeiro ministro desta Terceira República.

Eu não me atrevo a dizer que a coligação ganhou por mérito próprio. Mas que a campanha confusa dos seus adversários deu uma ajudinha, ai disso não duvido. E quando falo de adversários não meto só o PS. O PC e o BE tanto falaram no lobo que as pessoas deixaram de ouvir.

Agora, rezemos a Santa Rita de Cássia, padroeira das mulheres maltratadas e dos impossíveis: vamos lá a ver se como europeus, que presumimos ser, se consegue andar para a frente. O verdadeiro patriotismo está em pensar na melhor maneira de sair da alhada e não em convocar cruzada sobre cruzada (com a conhecida inutilidade e piores consequências que estas tiveram) contra o PAF. Falar e negociar é a chave do êxito. Não de A ou de B mas dos cidadãos simples que andam por aí.

( o folhetim traz demasiadas referências cristãs. É puro artifício. De facto o dia de anteontem era, no calendário patafísico perpétuo, 27 de Absoluto, festa das Santas Gigolette e Gaufrette, dogaresas. E o que se passou neste canto da Europa deve ser analisado nessa perspectiva).

d’Oliveira fecit (29 de Absoluto, hunyadi, festa de Le Jet Musical)

 

 

publicado por mcr às 17:44
link | comentar | favorito

Diário Político

images.jpeg

 

Calma, malta! Isto não o fim nem o princípio de coisa nenhuma

É só fumaça!

 

Vamos por partes.

Quarenta e três vírgula sete por cento dos portugueses não se deram ao trabalho de ir votar.

Três vírgula sete por cento votou branco ou nulo.

Dos cinquenta e quatro por cento restantes há os resultados que se conhecem. Há, é um modo de dizer. Ninguém garante que os cadernos eleitorais não continuem pejados de fantasmas, de mortos e enterrados que por inércia não foram varridos dos mapas.

 

Seria bom que os cavalheiros que abrem a boquinha para em nome dos seus partidos (sempre vencedores, ou quase: só o PS confessou a derrota. O resto ganhou tudo. Vão todos à taça dos campeões, ou algo do mesmo género e substância!) proclamam êxitos piramidais fizessem o grande favor de não emitirem opiniões sobre o estado de alma do povo português e do seu ódio medonho aos senhores Coelho e Portas. Pede-se serenidade, e calma à rapaziada que se entusiasmou demais.

Apenas os votantes disseram o que queriam. Mesmo que se não presuma que os não votantes estão de acordo com o Governo convirá não ver na sua abstenção um sinal contra o PAF. De facto, mesmo se o voto não é obrigatório, irou não ir pôr o papelinho na urna é, também um acto político.

E agora os partidos:

Um pequeno e simpático grupo obviamente mais ecologista do que a senhora Apolónia, entrou no Parlamento. Saliente-se o feito tanto mais que essa entrada coincide com o afocinhamento dos deliquescentes ex-bloquistas, do eterno MRPP, e do senhor Marinho e Pinto. Só isto, a derrota desta criatura, já é uma prova do bom senso dos portugueses que anteriormente o tinham sufragado à boleia de um partido que ele, uma vez eleito abandonou miseravelmente.

O BE (esquecido dos tempos em que, de faca nos dente,s uivava pelo Syriza e prometia uns amanhãs cintilantes de sangue e sirtaki) conseguiu apanhar todos os indignados que por aí andavam órfãos e muitos eleitores do PS que acusavam o partido de coisas inomináveis.

Já agora, convém saber se todos estes eleitores subitamente bloquistas estão de acordo com as teses do partido sobretudo as que tratam da Europa, do euro, da mundialização etc...

Se, por acaso, mero acaso, não estão, então não me levem a mal: enganaram-se no voto, desperdiçaram-no e nem sequer conseguiram com isso a tão miraculosa unidade da esquerda. Tal situação continua a ser uma miragem no deserto e nem Santo Antão o Cenobita vale aos que pedem, como o derrotado Tavares (hoje, no “Público”) unidade, unidade e mais unidade. Como era um entusiasta da unidade Tavares formou um partido a juntar ao copioso número dos que já existiam...

Destes votos de descontentes com o Governo que desaguaram no BE, extrai-se outra conclusão. No seu afã de esmagar o governo “ultra-liberal” desarmaram o único partido que, apesar de tudo (e eu não votei no PS) poderia derrotar o PAF! É obra!

O PC, solitária voz que também clama no deserto onde desde sempre se acoitou, viu-se ultrapassado pelo BE. De todo o modo cantou vitória. Canta sempre. Desta feita celebra três mil e tal votos a mais. E veio solenemente recordar ao povo amigo que sessenta por cento dos eleitores rejeitaram o PAF.

Esqueceu-se, o PC, pouco dado a contas de subtrair e somar, que noventa por cento dos mesmos eleitores o rejeitaram a ele!

De todo o modo, o PC segurou os seus eleitores, manteve a sua área de influência e deu outra vez boleia a uma coisa inexistente chamada “os verdes” que serve sempre para dizer no Parlamento alguma coisa que o PC acha não dever dizer.

O PS, pela voz de Costa (e confesso que o admirei!...) veio dizer que perdeu! Caramba, homem, isso é a única coisa que se não diz! Ou se o dizemos, logo de seguida, arranjamos uma desculpa, repartimos as culpas. Tivesse Costa usado da mesma linguagem na campanha, outro galo lhe cantaria. Agora, ali está, desafiando os adversários internos, a sair da toca (alguém os viu na campanha? Não? Eu também não os lobriguei. Mas vão aparecer para uma noite vagamente de “facas longas”). Há, porém um problema: não se vislumbra, naquela contestária arruaça ninguém com peso, percurso e autoridade, para enfrentar Costa. Ou alguém acha que o senhor Álvaro Beleza, uma sublime insignificância, ou a senhora Ana Gomes, anteontem tão chorosa, são capazes de ir a jogo?

A ideia, bronca e trucidadora, de que mal há uma derrota se deveMas substituir o líder prova a nossa inenarrável incultura política.

E os vencedores? Para a oposição impotente, eles foram derrotados por não conseguir a maioria absoluta! Não tenho, por mera culpa minha, mau feitio e neurasténico pessimismo, qualquer simpatia por Portas ou por Passos. O defeito é meu, claro.

Todavia, lembraria algum leitor mais indignado, que ali por Abril, Maio, Junho, mesmo Julho, não havia ninguém que não augurasse uma tremenda derrota da coligação. Estão feitos, dizia-se. Confesso que, por desfastio, apostei um par de almocinhos na vitória da coligação. Mas esperava perder...

Pertenço ao escasso grupo de pessoas que gosta, mesmo com o risco de perder a aposta, de contrariar os politicamente correctos e, mais ainda, os que acham que a política pede muita fé, muito entusiasmo, muita arruada e muita colagem de cartazes. E pouca, nenhuma, reflexão. O povo, para muitos destes cavalheiros, é uma abstração. O povo por quem eles, arrogantemente, pensam, ou julgam pensar.

Ora bem: nada disso ocorreu. O povo ordeiro e composto não está convosco!

As pessoas anseiam por segurança, estabilidade e detestam a aventura. E o desconhecido. Apanharam no lombo com uma carga de varapau de austeridade. Começaram, mal ou bem, a ver uma pequeníssima hipótese de melhorar a vida. Como a heroína de Gil Vicente, preferem “asno que os carregue do que cavalo que os derrube”. Conviria a um par de excelentes amigos meus reler os clássicos. Todos os clássicos e não apenas Mestre Gil. E a História pátria, a boa e não a panfletada que por aí corre a título de boa e progressista.

Desculpem esta tirada populista mas eu andei numa escola recheada de gente muito pobre e mantive durante muitos anos contactos com esses colegas humildes que fizeram pela vida, subiram a pulso, puseram os filhos a estudar, não recuaram perante nenhum sacrifício, emigraram, souberam o que era dividir uma sardinha por dois. Essa gente vota. Mesmo sem ter feito o liceu e, muito menos a universidade sabem da poda, da política e da propriamente dita. E sabem defender os seus interesses.

Agora, diz-se, abre-se um novo ciclo político. Nem tanto, nem tanto. Governos minoritários tivemos já uma boa meia dúzia. Soares esteve minoritário, Cavaco idem, Santana Lopes e Guterres e até o inefável Sócrates cuja sombra perpassou pela campanha e prejudicou largamente o PS. De cada vez que Soares ia visitar o “preso político” (só em Portugal é que alguém sem corar diz esta barbaridade e não é imediatamente chibatado pela imprensa!) os cidadãos escaldados viam nisso um recado de e para o PS.

De todos os governantes minoritários, destacam-se Soares que soube dar a volta ao texto e Cavaco (a quem todos atiram pedras e pedregulhos...) que aproveitou as burrices dos adversários para firmar a mais longa carreira de primeiro ministro desta Terceira República.

Eu não me atrevo a dizer que a coligação ganhou por mérito próprio. Mas que a campanha confusa dos seus adversários deu uma ajudinha, ai disso não duvido. E quando falo de adversários não meto só o PS. O PC e o BE tanto falaram no lobo que as pessoas deixaram de ouvir.

Agora, rezemos a Santa Rita de Cássia, padroeira das mulheres maltratadas e dos impossíveis: vamos lá a ver se como europeus, que presumimos ser, se consegue andar para a frente. O verdadeiro patriotismo está em pensar na melhor maneira de sair da alhada e não em convocar cruzada sobre cruzada (com a conhecida inutilidade e piores consequências que estas tiveram) contra o PAF. Falar e negociar é a chave do êxito. Não de A ou de B mas dos cidadãos simples que andam por aí.

( o folhetim traz demasiadas referências cristãs. É puro artifício. De facto o dia de anteontem era, no calendário patafísico perpétuo, 27 de Absoluto, festa das Santas Gigolette e Gaufrette, dogaresas. E o que se passou neste canto da Europa deve ser analisado nessa perspectiva).

d’Oliveira fecit (29 de Absoluto, hunyadi, festa de Le Jet Musical)

 

publicado por mcr às 17:28
link | comentar | favorito
Segunda-feira, 6 de Janeiro de 2014

diário Político 192

 

 

 

 

Kanimambo, Eusébio!

 

Pela cordialidade que sempre demonstraste!

Pela modéstia!

Pela elegância dentro do campo!

Pela honradez!

Pela alegria que deste a tantos, durante tanto tempo!

Pelo exemplo!

Pela lealdade!

 

Hotshelele hima dhanwa guma.*

 

d’Oliveira 6.01.14

* todos seremos chamados a morrer (de um msaho de Felisberto Kambane)

na gravura: Maputo, a baía

publicado por mcr às 10:51
link | comentar | favorito

.mais sobre mim

.pesquisar

 

.Setembro 2023

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2

3
4
5
6
7
8
9

10
11
12
13
14
16

17
18
19
20
21
22
23

24
25
26
27
28
29
30


.posts recentes

. diario político 212

. Diario político 212

. diário político 209

. Diário político 207

. diário político 207

. diário político 206

. Diário político

. Diário Político

. diário Político 192

.arquivos

. Setembro 2023

. Abril 2017

. Agosto 2016

. Junho 2016

. Abril 2016

. Novembro 2015

. Outubro 2015

. Janeiro 2014

.tags

. todas as tags

.favorito

. au bonheur des dames 542

blogs SAPO

.subscrever feeds

Em destaque no SAPO Blogs
pub